segunda-feira, 11 de agosto de 2014

A operação Wikipédia — Testando hipóteses


Serra e Afif
Se analisarmos o histórico das intervenções na Wikipédia feitas a partir do IP do Palácio do Planalto, constataremos facilmente que as acusações da Globo e de seus jornalistas foram irresponsáveis e levianas.

Mais da metade das alterações não tem conotação política ou administrativa, deixando bem claro que o uso da internet no Palácio era feito com desenvoltura, por parte de visitantes e servidores.

Possivelmente até mesmo turistas que passeiam ali por perto tinham acesso à rede, seja por conhecerem alguém ali dentro do Palácio, seja porque perguntaram a alguém que sabia a senha de acesso, já que esta era fornecida generosamente a qualquer um que a pedisse.

Essa história me intriga. Em outros posts, já mostrei que todas as grandes redes públicas, no Brasil, tem seus IPs usados por centenas ou milhares de pessoas, e são inúmeras as intervenções na Wikipédia partindo dessas redes.

Difamaram até mesmo o Raul Seixas a partir da internet do governo de São Paulo!

Se a alteração no verbete de Miriam Leitão partiu de um servidor público, está claro que se trata de um imbecil, ao não considerar que, se o Wikipédia guarda os Ips dos usuários que acessam o site, a ação teria consequências políticas.

Por outro lado, e se foi uma armação?

Não podemos descartar essa hipótese, até porque alguns fatores despertam suspeitas. Por exemplo, por que Miriam e Sardenberg protestaram só agora por algo que aconteceu em maio de 2013? Estariam esperando o momento certo?

Estariam esperando o processo eleitoral?

As informações sobre cada usuário do Planalto ficam guardadas até seis meses. Se a denúncia tivesse sido feita dentro desse prazo, portanto, o governo poderia identificar facilmente quem fez a alteração nos verbetes.

Eu tenho analisado com afinco o histórico de intervenções feitas a partir do famigerado IP 200.181.15.10, tentando encontrar alguma pista que me ajude a descobrir quem mexeu nos verbetes da nossa querida Miriam.

Partilho com vocês o que descobri até o momento. Por sugestão de um internauta, atentei para algumas coincidências.

Os verbetes de Miriam Leitão e Sardenberg foram alterados nos dias 10 de maio, depois no dia 13 e 14. No dia 14 de maio, outro verbete foi alterado por diversas vezes: “Ourinhos”, referente a uma cidade do interior de São Paulo. Para ser exato, o verbete Ourinhos foi alterado 25 vezes pelo IP do Planalto. É o verbete da Wikipédia que mais recebeu atenção dos usuários do referido IP.

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Não é estranho usar tanto a rede do Planalto para alterar o verbete de um município do interior de São Paulo?

As alterações são sempre no sentido de criticar a atual administração. Não é implausível acreditar que o usuário é de Ourinhos e faz à oposição da prefeitura.

Alguns meses depois, o verbete de Claury Santos Alves da Silva também é alterado, duas vezes, usando-se o IP do Planalto.

‎Claury é um dos políticos mais ilustres de Ourinhos. Eleito em 1982, foi um dos vereadores mais votados da história do município. Reelegeu-se para um novo mandato em 1988. Em seguida, foi prefeito de Ourinhos entre 1993 e 1996. Elegeu-se deputado estadual em 1998. Seu partido era, e continua sendo, o PTB. Mas aliou-se a José Serra, do PSDB, quando este se candidatou ao governo de São Paulo em 2006.

A partir de 2008, Claury exerce a função de secretário de esportes e turismo do estado de São Paulo, no governo José Serra.

Em 2012, Claury tenta novamente ser prefeito de Ourinho, mas não se elege.

Durante a gestão Serra no Palácio dos Bandeirantes, Claury tinha como colegas Aloysio Nunes Ferreira Filho, então secretário-Chefe da Casa Civil e Guilherme Afif Domingos, secretário do Emprego e Relações do Trabalho.

Outro colega de Claury era Nelson de Almeida Prado Hervey Costa, adjunto na Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho, ainda no governo Serra.

A partir daqui, o papel de Nelson de Almeida ganha importância em nossa história. Em 2010, ele se torna Presidente do Conselho de Administração da Imprensa Oficial do Estado S.A. – IMESP, e secretário do Governo Municipal, na gestão Kassab.

Pulemos para 2013.

No dia 6 de maio de 2013, a presidenta Dilma anuncia a criação da Secretaria da Micro e Pequena Empresa (SMPE), e nomeia como titular da pasta ninguém menos que Guilherme Afif Domingos, atual vice-governador de São Paulo na gestão Alckmin e ex-secretário do Emprego e do Trabalho na gestão anterior, exercida por Serra.

A imprensa recebe a notícia com perplexidade, sobretudo porque Afif não renunciou ao cargo de vice-governador. Ele continua até hoje acumulando os dois cargos.

A SMPE, apesar de ter status de Ministério, e funcionar num edifício externo, no Setor de Rádio e TV Sul, 701, quadra 03, bloco M, 6° andar, é vinculada à Presidência da República, o que confere a seus funcionários livre acesso ao Palácio do Planalto.

O secretário executivo de Afif na SMPE é Nelson de Almeida Prado Hervey Costa, que desfiliou-se do PSDB em 20 de maio de 2013, ou seja, alguns dias depois de iniciar seus trabalhos em Brasília.

Nelson era filiado ao PSDB desde 1995, e sempre trabalhou em cargos de confiança do partido, sobretudo junto à Serra.

Em virtude de uma ligação tão orgânica com o PSDB, sua desfiliação não me parece sincera, mas apenas uma maneira de evitar atritos junto ao novo patrão, o governo do PT.

Ou um disfarce.

As alterações na Wikipédia de Miriam Leitão, assim como na de Ourinhos e Claury, começaram a ser feitas apenas alguns dias após a entrada em operação da SMPE, e da chegada desse bando de raposas serristas ao galinheiro petista.

Ou seja, temos que lidar com essa hipótese, de que um ou mais tucanos infiltrados dentro do governo tenha participado de uma operação de sabotagem política.

A “bolinha de papel”, aquela farsa protagonizada por Serra em 2010, agora pode estar voltando a acontecer, e operada pelo mesmo Serra, através de ex-companheiros de governo, tucanos fieis que, por um desses acasos da vida, hoje tem acesso privilegiado ao Palácio do Planalto.

Estas são apenas especulações. Tocqueville ensinava que o tempo eleitoral é sempre um momento de profunda crise política. E durante as crises é preciso pensar em tudo. Todas as conspirações ganham força e consistência quando o jogo de poder se intensifica.

Em vista dessas circunstâncias, diria Ali Kamel, não custa nada “testar hipóteses”.

Miguel do Rosário
No O Cafezinho

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