quinta-feira, 16 de outubro de 2014

É possível discordar de Dilma, mas insinuar-lhe desonestidade é uma desonestidade repugnante


Janio de Freitas: A divulgação (de depoimentos da delação premiada) alimentou a injustiça –irreparável– com uma pessoa que só as ordinarices desta campanha eleitoral querem dar como desonesta: em boa ou em má-fé, é possível discordar de tudo o que Dilma Rousseff disse, pensou e significa, desaprová-la até o desprezo, mas insinuar-lhe desonestidade é uma desonestidade repugnante.
 
Juízes federais e procuradores da República moveram suas associações corporativas, em especial as seções paranaenses, para defender o que não precisava ser defendido. O questionável na audiência do corrupto da Petrobras, Paulo Roberto Costa, pela 13ª Vara Federal Criminal do Paraná, não foi que deixasse de ser "estritamente técnica" e de "respeitar a regra dos processos judiciais", aspectos ressaltados pelo corporativismo judicial. Questionável foi a realização da audiência ao abrir-se o segundo turno, do que resultou a inclusão do Judiciário na disputa eleitoral –com benefício de um dos lados.

Uma das defesas da audiência publicadas na Folha argumentou, referindo-se à divulgação do depoimento de Paulo Roberto, que "trata-se de informação sob domínio público que não pode ser escondida". Não se trataria de esconder coisa alguma, mas de respeitar democraticamente as circunstâncias do momento especialíssimo vivido pelo país. E, para isso, não mais do que aguardar três semanas para tomar o depoimento do acusado e vê-lo divulgado como mereceria.

A respeito do prazo, a nota do Ministério Público Federal defende que a audiência "obedeceu aos prazos fixados para procedimentos de réus presos". Pode ser, para os ainda presos. Mas Paulo Roberto não estava preso, mandado para sua casa na Barra da Tijuca pela mesma 13ª Vara.

Ainda contra esconder o que não estava nem ficaria escondido, disse o artigo que, divulgado o depoimento acusatório, cabe agora ao acusado defender-se (dos acusados no noticiário, só o PT foi citado no artigo). É uma tese que aguarda argumentos substanciosos, porque até hoje os doutores do Direito acreditam que o ônus da prova cabe ao acusador, não ao acusado. O próprio artigo tem a correção de ressalvar que "as denúncias não foram comprovadas", lembrando a conveniência de vê-las "com máxima cautela", por "envolverem delação premiada". O que não não envolviam.

Outra contribuição, também na Folha, à defesa da audiência naquela data e à divulgação das acusações então feitas, afirma que o juiz "tinha a obrigação" de "tornar públicas" as declarações do depoente. Sendo assim, o juiz faltou com sua obrigação. O depoimento de Paulo Roberto foi relatado aos repórteres pelo advogado do doleiro Alberto Youssef, que teria acompanhado a audiência. Os três partidos dados no noticiário como acusados por Paulo Roberto, no depoimento, não foram mencionados por ele. Foi também o advogado de Youssef quem os citou para os repórteres, esclarecendo não atribuir a citação ao depoente.

Mas o juiz não descumpriu "a obrigação", porque nunca a teve. Juízes pronunciam-se nos autos, diz uma das poucas regras judiciais de conhecimento geral. Não têm "a obrigação" de tornar públicas as declarações de ninguém, não são porta-vozes de acusados ou de testemunhas.

O juiz tem o dever, este sim, e acima de todos os outros, de assegurar imparcialidade às partes. Não há sinal algum de que tal dever haja sido maculado na 13ª Vara. Já a tomada do depoimento de Paulo Roberto Costa em 8 de outubro, ao iniciar-se o segundo turno, com a grande probabilidade de sua divulgação, para não dizer a fácil certeza por se tratar de audição aberta, foi uma impropriedade. A divulgação alimentou a injustiça –irreparável– com uma pessoa que só as ordinarices desta campanha eleitoral querem dar como desonesta: em boa ou em má-fé, é possível discordar de tudo o que Dilma Rousseff disse, pensou e significa, desaprová-la até o desprezo, mas insinuar-lhe desonestidade é uma desonestidade repugnante. 

Janio de Freitas na Folha

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